jueves, 1 de octubre de 2009

FERA BIFRONTE de Claudio Daniel

























FERA BIFRONTE, DE CLAUDIO DANIEL

Fera Bifronte (Bauru: Lumme Editor, 2009), o quinto livro de poemas do autor brasileiro Claudio Daniel, reúne peças escritas entre 2005 e 2008, que abordam temas como a violência urbana, a guerra, a publicidade, a sociedade de consumo e outras questões relacionadas ao mundo contemporâneo, conciliando a referencialidade com apurado trabalho de linguagem. O autor utiliza palavras raras, faz construções sintáticas inusitadas, por vezes criando relações mais analógicas do que gramaticais entre as palavras, e utiliza formas estruturais como o labirinto de versos e o labirinto de palavras, típicos do barroco histórico português. Nos poemas de Claudio Daniel, encontramos recursos como a “escrita diabólica” (versos escritos de trás para diante), enigmas, anagramas, o uso abundante da elipse e da imagem poética. Os poemas em prosa (como Caranguejo) apresentam cenas rápidas e fragmentárias, que recordam a velocidade narrativa do videoclipe. A sátira e a ironia também estão presentes, como na série Gabinetes de curiosidades, que retrata a sociedade de consumo em três momentos, ou cenas: Pet Shp, Coffee shop e Sex shop. O livro, que tem posfácio assinado pelo poeta português E. M. de Melo e Castro, foi vencedor da Bolsa Funarte de Estímulo à Criação Literária, em 2008, e pode ser solicitado junto à editora pelo e-mail vendas@lummeeditor.com


FERA

Animal metafísico desliza aspereza até abolição de vocábulos.

Uivos óticos;

patas enviesadas;

fileiras assimétricas de vértebras,

códices de enigmas ósseos.

Em branco aniquilar

sua mandíbula,

aberta como fenda sexual

interrogante.

Flora esquelética no pelame,

rarefeita desde os tufos

da cabeça,

um mofo de paisagem

desnudante.

— Seqüência numérica tatua seu dorso

improvável, circunscrito

à descentrada geometria.

Olho-de-raio persegue desfocados

passos súbitos

num deslocamento

de vermelhos.


2007




ESCRITO EM OSSO


I

Fósseis argumentos
Esqueléticas grafias
Autofágica página
Inescrita, devoluta.


*
lepra da língua simulando sêmele.
mão-do-caos
olho-de-treva
um corvo azul irrompe
no poema.


*
Extinção de estrela ou
Mudez do mar.


*
falange deslabiada contradição
entre memória e mundo.


*
Fossem falcões de simetria,
Mas apenas figuras
Expiraladas.


*
palavras desventradas
da cadela, sons fecais
em hinos de desmemória.


*
Pois toda história humana
É um volume fechado
De cíclica desleitura.


*
um corvo azul irrompe
no poema.


*
Essa a letra fosca a peripécia
O motejo expandido
Em espelhismo de lacraias.


II

sou espectro de mim.

*
no extravio das hipóteses,
expansão de territórios
fermentando fêmures

(ruínas de um vocabulário;
escura caligrafia
rasurando crânios).

desfoliante na curva do vento,
onde o leão do labirinto
recifra-se em ecos.

(...)

sou alimária de mim.

*

a mente como um focinho
escavando raízes
no aterro da memória

(palavras são despojos,
o sentido fraturado de tudo:
cegueira inventando cores).

precárias percepções
do caos ensimesmado:
nenhuma música aqui.

(...)

sou descosturado de mim.

*

flagelar os chifres do céu,
catarata-capricórnio
esfumada em carbono

(destrinchar o mapa celeste
com cálculos e equações
até o nada absoluto.)

num ponto qualquer
do planeta, órgãos retirados
de corpos sem autópsia.


Para Wilson Bueno, 2006




2 comentarios:

Anónimo dijo...

Tres intiresno, gracias

Anónimo dijo...

Leer el mundo blog, bastante bueno